Texto da autoria de Rui Castro
Cada linha que escrevo é um
pedaço do meu ser que transplanto para o papel. Tudo o que redijo é pessoal,
intimista, interior, puro, sem maquilhagem, sem limagens, sem banhos de edição ou
censuras de lápis azulados. Cru, sim, por vezes demasiado cru. Mas sempre fui
assim, intempestivo, resmungão, questionador, descontextualizado no mundo em
que estava, vivendo num mundo só meu onde as palavras valem mais do que marcas
e frases enfeitiçam-me e anestesiam-me como se de um medicamente se tratassem.
Quando escrevo sou o terapeuta de mim mesmo. Sem fármacos, químicos ou
quaisquer substâncias que me retirem a clarividência, apenas eu e o meu
cérebro. Iluminado, ativo, em combustão constante, porque cada neurónio debita
personagens, cenários, enredos, diálogos, conceitos em velocidades
supersónicas. Dentro do meu motor que é a mente, estou constantemente a criar,
a desenhar o próximo texto, a estrutura-lo, não lhe dando descanso.
Senão escrever sinto-me banal,
sinto-me perdido neste mundo, a vida perde aquela tonalidade garrida que me
apaixona e torna-se lenta, como se de um domingo pardacento de Novembro se
tratasse, num início de inverno inútil e aborrecido. Preciso de me sentir vivo,
de sentir o pensamento a processar rapidamente e ao mesmo tempo olhar e ver a
história a ganhar corpo, forma, esquema e sobretudo eloquência e uma narrativa
que faça as pessoas gostarem e principalmente entenderem o que leem. Se cada
pessoa que lê o que eu escrevo se identificar com uma frase, uma metáfora, uma
referência, fico feliz, é sinal que consigo tocar no âmago delas e fazê-las
sentir perto da minha arte, daquilo que eu idealizo para a minha escrita.
Escrevo para mim, para meu prazer pessoal, para me sentir bem, mas se alguém se
sentir igualmente bem com cada linha, enche-me de orgulho, satisfação,
realização e sentido de dever cumprido.
Quando morrer, que cada texto que
escrevi até essa altura seja relembrado como a melhor parte de mim. Que sejam
eles a falarem de quem eu era, de como era, de como pensava. São o meu reflexo,
o meu espelho, o meu confessionário diário. Cada erro, cada amargura, cada
alegria, está expostas nos artigos, nas histórias, nos desabafos, nos poemas
que fiz, faço e farei durante toda a vida, até me sentir 100% são mentalmente e
perceber que aquilo que crio ajuda alguém, porque a arte também pode ser
humanismo, solidariedade, entreajuda. Que cada noite que eu viva na plenitude
das minhas faculdades seja brindada a escrita e solidão, porque preciso de
solidão para me transformar em vários seres sem deixar de ser eu e para viajar
para enésimos destinos sem sequer tirar os pés do chão, apenas com a força do
músculo que se torna o objeto mais forte, potente e poderoso do mundo e que o
ser humano em milhares de anos de existência nunca conseguiu dar-lhe a
totalidade do uso e quando o fizer dominará tudo no planeta e terá faculdades
assombrosas:
O cérebro,
Boa noite.
Rui Castro
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